domingo, fevereiro 18, 2007


(Foto – O Cântaro Zangado)

Antes de mais, deixem que vos diga que não sou beirão e só há bem pouco tempo é que tive oportunidade de me ir inteirando dos problemas da região e sobretudo da nossa Serra. Assim sendo, parece-me normal que possa trocar alguns nomes, ou usar uma linguagem que não a correcta aquando da citação de vários locais ou mesmo nomes usados na gíria da região.

Sei que muito se tem escrito e se continua a escrever sobre a nossa Serra da Estrela, mas, deixem que vos diga, que se continuarmos a escrever sem nada fazer, corremos o risco de perder de vez este património que é de todos nós.

Desde pequeno que me lembro de ir à Serra. Antigamente era uma aventura a simples deslocação de Abrantes à Serra da Estrela. Eram cerca de 200 km. Todo o percurso era feito em Estrada Nacional esburacada, onde o mote principal era curva para a direita, logo seguido de curva para a esquerda. Assim podíamos aproveitar para observar condignamente a natureza (com alguns enjoos pelo meio). Como a viagem era longa, almoçávamos sempre pelo caminho. Quando chegávamos à torre e o meu pai tinha oportunidade de estacionar devidamente o carro, no meio de uma ou duas centenas de automóveis que se amontoavam na berma da estrada, era o delírio. Para um rapazote que poucas vezes tinha visto neve, (infelizmente não neva em Abrantes) era giro brincar com ela, era algo diferente. Aproveitava para escorregar um pouco com um saco de plástico, como os demais… e fazer um bonequito de neve. Depois da incursão à Torre dávamos quase sempre uma volta por Manteigas e abandonávamos a região rumo a casa. Pouco mais conheci da Serra, nessa altura.

Cerca de vinte anos depois, é com uma enorme tristeza que encontro uma Serra desfalcada do seu património florestal, (toda a zona das Pedras Lavradas por exemplo) devido a incêndios sucessivos; “algarveada” no topo, com lixo e esgotos a correr a céu aberto; mini estâncias de montanha sem condições de laborar; aldeias de montanha; estradas esburacadas e passeios manhosos a parecer Beirute depois da guerra; centros comerciais ampliados na Torre (vulgo barracas, o primeiro já existia) e um edifício degradado do lado poente da torre a uns 100 metros da mesma; a cabine inferior do projecto teleférico Piornos-Torre, que parece não querer abandonar o local… enfim, uma falta total de valores e um desrespeito enormíssimo pelo meio ambiente.

A minha maneira de ver a Estrela compreende, em primeiro lugar, a extinção\ demissão do agente responsável pela tutela do Parque Natural, por inoperância e falta de valores morais e éticos. Compreende também a demolição de todos os edifícios da Torre com a excepção como é óbvio da Capela e das duas torres da Força Aérea, sendo as últimas recuperadas mantendo a traça original. A Estrada Nacional que liga o Centro de Limpeza de Neve à Torre teria os dias contados. A partir daí, só de telecabines (ficando o local das mesmas ao cuidado de técnicos especializados). Todo o entulho proveniente da remoção do alcatrão seria removido. Do lado da Lagoa Comprida defendo o mesmo, da nova rotunda (ligação Lagoa Comprida Portela do Arão) para cima só de telecabine. Defendo também projectos de telecabines de Alvoco da Serra e Unhais da Serra, para que se possa subir sempre que há muita ou pouca neve. Sou favorável à construção de um túnel, pelo menos que efectue a ligação perdida entre a Covilhã e Seia, ficando o estudo do local a cargo de técnicos responsáveis. Quem o irá pagar… talvez os mesmos que vão pagar uma terceira ponte sobre o Tejo em Lisboa, um Aeroporto da Ota ou mesmo um TGV (note-se que sou contra o Aeroporto e o TGV). Sou da opinião que as pessoas que vivem e trabalham nesta região devem ter condições condignas para desenvolverem o seu trabalho/ actividade. Não podemos nem devemos parar a evolução, pois note-se que esta já é uma região onde as taxas de natalidade são baixas e a continuar assim menores ficarão. Devemos avançar, com respeito mútuo pelo ambiente e pelas gentes, sem nunca perder de vista o que é prioritário.

Defendo uma reflorestação urgente de toda a Serra com espécies autócnes, pois são mais resistentes ao fogo, dando especial atenção ao carvalho (eucaliptos nem vê-los, quanto aos que existem deveriam ser arrancados pelas raízes). Iniciativas como “Um Milhão de Carvalhos para a Serra da Estrela” precisam-se. Relativamente à Estância da Turistrela e uma vez que o estado os beneficiou com uma licença de exploração por uma quantidade infindável de anos, defendo que a mesma se mantenha como está, mas com bastantes modificações na traça do seu edifício de apoio e aluguer de equipamentos (o mesmo parece um Bunker e não estamos em tempo de guerra). Note-se que não existe outra Serra para a prática do Esqui ou Snowboard em Portugal).

A minha visão de ver o turismo compreende todos aqueles desportos onde o motor impulsionador é o nosso coração, com especial relevo às caminhadas de montanha (uma vez que a neve tende a rarear devido ao aquecimento global), passeios de Btt, observação/ contemplação da natureza, acampamentos em locais propícios… enfim, toda uma série de actividades, onde o respeito pela natureza dá o mote.

Recordo-me de Cangas de Oniz, pequena localidade perto dos Picos de Europa, onde em qualquer esquina existe uma pequena empresa cuja função é prestar serviços, alugar equipamentos e organizar visitas/ passeios por toda a região. Vejam a riqueza que se iria gerar por cá.

Tenho a certeza que muito mais havia a dizer, por agora fico por aqui. Opinem se quiserem.

6 comentários:

Anónimo disse...

Subscrevo o que pensas sobre a Estrela. Enalteço a tua grandeza, a tua consciência ecológica e o teu lado humano!!! Gostava de ser assim mas reconheço a minha pequenez …
É claro que não vou esconder o quão me incomoda e envergonha o desrespeito por este local único, a falta de sensibilidade, o desprezo, a falta de visão de muita boa gente que se diz responsável.
No entanto, confesso, quando observo a Serra abstraio-me de toda a situação que descreveste e deixo-me levar ao interior de mim mesma. Gosto de me perder nela, de ouvir os ecos da Natureza, de sentir o cheiro, a brisa. Sinto-me em paz!
O pôr-do-sol é indescritível! Imagino como será mágico o nascer do dia. Gostava de poder experienciar esse momento. Quem sabe um dia…!

nGaspar disse...

Antes de mais agradeço o elogio e a visita.
Compartilho da tua opinião relativamente à Serra. Esta é de facto um lugar mágico. Transmite-me a calma e a serenidade que preciso, para enfrentar cada dia que percorro… é de facto um lugar mágico.
Para que continue assim, é necessário que tenhamos consciência dos erros que fazemos no presente, para que o futuro seja mais risonho. Como diz o ditado “o que semeares hoje colherás amanhã”
Na boa gíria beirã…um grande Bem-haja.

Gomes Leitao disse...

Ora viva, aqui estou eu a fazer uma visita ao teu blogue. Concordo com o que escreves a respeito da Estrela. Não temos necessariamente de, à força, possuir uma estância (?) de ski. Porque não maximizar o que temos de bom? Um exemplo, serão os passeios pedestres. Um grande abraço, Luis Leitao

nGaspar disse...

Olá, Luís!
De facto, sem neve não temos outra hipótese, se não apostar em turismo, tipo Picos da Europa, que bem conhecemos.
Esta quarta-feira, quando me dirigi à Estância, aquilo parecia o Algarve! Tal era o calor e a falta de neve… enfim.
Um grande Bem-haja.

ljma disse...

Nuno, olá!
Só agora dei com este post, tenho que por cá passar mais frequentemente.
Eu concordo com quase tudo o que dizes, mas acho também que muito do que há a fazer podia começar a ser feito já de seguida. A ideia de que os problemas só se resolvem quando houver telecabines, túneis, IP's ou milhões de euros é uma forma de adiar a solução dos problemas. E parece-me que, de facto, não os queremos resolver. É que, para tornar a Torre um verdadeiro "núcleo de lazer", temos que limitar a afluência de pessoas em certos dias. Justamente naqueles dias que são considerados grandes sucessos... E isso (limitar a afluência) assusta muita gente. Por outro lado, e isso tem que ser levado em linha de conta, há a questão de saber se as telecabines, cada uma delas, seriam rentáveis. Se temos dúvidas disso, é capaz de ser melhor ficarmos quietos, porque já temos entulho abandonado na Serra que chegue, e entulho abandonado é no que se transformam os projectos âncora quando dão para o torto...
Uma das coisas com que não concordo no que dizes é na atribuição de responsabilidades ao PNSE. Claro que tem algumas culpas e muitas fragilidades (esta é a minha opinião de outsider, e pode não corresponder à realidade), mas ainda é a única barreira que se atravessa no caminho de alguns projectos algarveantes... Só me queixo de isso acontecer tão infrequentemente ou, pelo menos, assim parecer.
Um abraço, força aí!

nGaspar disse...

Antes de mais, obrigado pela visita e pelas palavras de apreço.
Sem dúvida que temos que começar a trabalhar rapidamente. Eu propunha para já a plantação de espécies autócnes em toda a zona ardida das Pedras Lavradas. Toda esta grande área foi bastante fustigada nos recentes incêndios de 2005 e encontra-se já limpa na sua maioria. Caso assim continue e sempre que cai alguma chuva, esta provoca grandes enxurradas de lama, pois não existem plantas que sustenham a terra, com os devidos prejuízos inerentes (que a população de Alvoco da Serra conhece bem, por exemplo). Assim sendo, estaríamos já a resolver dois problemas. Outra acção que não necessitaria de grandes investimentos, prender-se-ia com a remoção do edifício da telecabine de Piornos (que já existe desde a minha juventude), assim como de entulho e alguns cabos depositados na zona poente da Torre. Não falo das duas torres, pois já as consegui interiorizar e considero-as já como que ícone. Poderiam sim, ser remodeladas e devidamente aproveitadas… como? Substituíam facilmente o Centro Comercial da Torre que não passa de uma barraca. Para terminar, também eram bem-vindos mais alguns caixotes para o lixo nas zonas de maior afluência de pessoas em todo o parque.
Quanto à questão dos túneis, eu considero que devemos dar condições a quem trabalha na zona interior à Serra, tendo como exemplo Gouveia, Seia, Loriga, localidades que ano após ano vêem a sua população diminuir por falta de infra-estruturas e trabalho, por exemplo. Repare o que seria se o governo da República Portuguesa (não o meu) resolvesse acabar com o serviço de urgências no hospital de Seia por exemplo? Quando falo em 1 ou 2 túneis, não lhes estou a atribuir a função insignificante de trazer e levar turistas rapidamente, mas sim uma função dinamizadora de toda a região para empresas que se queiram estabelecer por cá.
No que concerne às telecabines, estas deveriam ser alvo de estudos de rentabilidade, como é óbvio. Em qualquer país civilizado isso acontece, menos em Portugal. Como exemplo aqui fica a telecabine no Parque Expo que actualmente está entregue às moscas. Era bem-vinda na nossa serra.
Um grande Bem-haja.

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